As reuniões anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (BM) começaram nesta segunda-feira (21) em Washington, em meio a uma crescente ira pelo fracasso dessas instituições em enfrentar de forma efetiva a pobreza, a desigualdade e os perigos evidentes das mudanças climáticas, por declaração de líderes de que estar reuniões serão diferentes, e por indícios de que o poder destas organizações multilaterais está se desvanecendo ao surgirem instituições mais democráticas no âmbito internacional.

“O crescimento a médio prazo está projetado a ser reduzido” a nível global, reconheceu na semana passada a diretora administrativa do FMI, Kristalina Georgieva, em um resumo desalentador do que se pode esperar na reunião deste ano.

“O crescimento está longe de ser suficientemente bom. Não é suficiente para erradicar a pobreza mundial, nem para criar o número de empregos que requeremos, nem para vastas necessidades de investimento, inclusive para a transição verde”.

O BM, cuja meta central é “erradicar a pobreza e impulsionar o desenvolvimento inclusivo”, reconheceu também na semana passada que, com base na atual trajetória, seria necessário mais de um século para tirar toda a população mundial da linha da pobreza, atualmente calculada em uma renda de 6,85 dólares por dia.

Ambos os líderes dessas instituições, Georgieva e seu homólogo no BM, Ajay Banga, insistiram que, se os países decidissem trabalhar em conjunto, poderiam mudar essa realidade econômica.

Plano Marshall às avessas

“2023 foi um desastre em termos de apoio ao mundo em desenvolvimento”, escreveram recentemente Lawrence Summers, ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos, e o economista e político indiano N. K. Singh. “Taxas de interesses crescentes e ausência de bônus e empréstimos implicam que quase 200 bilhões de dólares fluíram para fora dos países em desenvolvimento em direção a credores privados em 2023, muitíssimo mais que o financeiramente incrementado pelas instituições financeiras internacionais”.

O sistema financeiro internacional, declarou o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em setembro, “é um Plano Marshall ao contrário, onde os países pobres financiam os ricos”. Esta crítica foi compartilhada por outros líderes, como os mandatários da Colômbia, Gustavo Petro, e da África do Sul, Cyril Ramaphosa.

Nos últimos anos, Lula e outros líderes mundiais foram além das críticas, desenvolvendo propostas concretas através do Grupo dos 20 (G20), visando implementar um imposto universal sobre as pessoas e organizações mais ricas, e criar um banco internacional alternativo estabelecido pelos países do BRICS (que se reúne esta semana na Rússia, ao mesmo tempo que acontecem as reuniões em Washington), assim como demandar mudanças nas estruturas de governança e relações de poder nestas instituições multilaterais e na ONU.

Guardiões do sistema

O FMI e o BM continuam sendo os “guardiões do sistema financeiro” atual, que inclui não só os fundos fornecidos pelos países membros a estas instituições, mas também as normas sobre fluxos de capital privado, comércio e investimento multinacional.

Georgieva, do FMI, não está modificando esse papel. Na semana passada, ela insistiu que o crescimento econômico continua sendo “a chave” e detalhou uma agenda que inclui mobilizar capital, aumentar a produtividade e reformar mercados de trabalho para que os trabalhadores corretos sejam colocados nos empregos corretos. A chefe do FMI também reconheceu que as reformas e medidas recomendadas pela instituição “nunca são populares” entre o público dos países.

É fácil entender a razão disso. Uma pesquisa realizada pela Oxfam Internacional conclui que “94% dos países com empréstimos atuais do BM e do FMI cortaram investimentos vitais em educação pública, programas de saúde e proteção social ao longo dos últimos dois anos”. Para Kate Donald, chefe do escritório da Oxfam Internacional em Washington, “estes cortes não só são desalentadores, mas são perigosos e fundamentalmente contra o desenvolvimento”.

Pressões e mudanças paliativas As duas instituições anunciarão algumas mudanças e modificações em suas práticas esta semana. Sob pressão do Grupo dos 77 e do Grupo dos 24, o FMI acordou reduzir os encargos que essencialmente aumentam os custos dos empréstimos aos países em desenvolvimento. Também haverá novos compromissos para ampliar o financiamento voltado a combater as mudanças climáticas, mais fundos para empréstimos e subsídios para os países mais pobres e buscar modificações para oferecer mais capital disponível ao Sul Global. Porém, como assinalam especialistas, compromissos não são ações.

Ao mesmo tempo, estas reuniões se realizam sob a sombra das eleições nos Estados Unidos e suas implicações potenciais para estas instituições no futuro imediato. O país é o maior acionista do FMI, com 16,5% do total, o que efetivamente lhe permite frear mudanças maiores nestas instituições, incluindo sua forma de governança. A China, em contraste, tem só 6,5% das ações, Brasil 1,2% e México 1,8%.

Apesar disso, alguns promotores de mudanças veem algumas indicações positivas. Alex Main, diretor de políticos em CEPR, assinalou como um exemplo o esforço para obrigar o FMI a reduzir seus encargos. Em entrevista ao La Jornada, também apontou para a chamada Iniciativa Bridgetown, impulsada pela presidenta de Barbados, Mia Motley, como outro exemplo de um esforço para forçar que os credores incorporem cláusulas de desastres naturais que permitam a suspensão do pagamento de empréstimos em caso desses desastres.

Mas nem perto foi alcançado o necessário. Simon Stiell, secretário-executivo da Convenção Quadro da ONU sobre Mudança Climática, reportou que um trilhão de dólares foram mobilizados para abordar a mudança climática no ano passado, mas que essa soma só representa um quarto do que se requer anualmente para isso.